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Cinzenta.

Silêncio. Céu cinza. Um silêncio arrebatador, calmo, que nascia e fluia naquela massa densa de água salgada. Eu estava boiando, com as orelhas abaixo d'água, o corpo leve, a mente vazia. Completamente vazia. Um estalo ou outro debaixo daquela imensidão marítima, mas, no geral, um silêncio verde escuro, pesado. Ondas levantavam mais ao longe, e eu conseguia ouvir seu movimento por debaixo d'água, mas num volume baixo, o silêncio ainda me preenchia muito. Reviravoltas aconteciam longe de mim. Crianças brincavam na praia, outras pessoas nadavam mais ao raso, e tsunamis se erguiam no meio do oceano. Gotas geladas e finas caíam do céu e me tocavam a testa e o nariz, ainda pra fora da massa salgada e líquida. Eu me fechava no meu próprio universo. Me sentia preenchida pelo vazio, cada vez mais. E cada vez mais impelida a fazê-lo. Algumas algas me tocavam os pés, e alguns peixes, as mãos, mas eu continuava intacta, boiando, sem coragem ou covardia de me mover. Meu corpo s

Um Outro N.

Ela estava a meu lado direito, com um copo de cerveja em mãos, num gesto espelhado ao meu. Conversávamos sobre alguma amenidade passada em mais um dia de escritório. Ela tinha o cabelo repicado, e os olhos densos, cheios de experiência, apesar da pouca idade. Tinha também um ar meio sarcástico, que me fazia lembrar alguém... O ambiente era barulhento, porém mais claro que de costume. Como sempre ela tinha alguma peripécia pra me contar, situações que chamávamos de "Natalhisses". Experiências que só nós duas poderíamos entender, afinal, o nome só nos pertencia. E, mais do que isso, éramos a perfeita personificação do tal. Ela me fazia rir muito. Nos conhecemos há pouco mais de um ano, mas a sintonia agora era tamanha que... Me espantava. Não éramos melhores amigas, porque a definição disso que normalmente nos vem à cabeça é alguém que te conhece há muitos anos e com quem você já partilhou muita bagagem. Esse não era o caso ali. É só que... Entre aqueles copos de ce

A Ponte.

Saiu do trem com a pressa e o cuidado habituais, segurando a bolsa com uma mão e a protegendo com outra. Passou as catracas segurando o vestido para que não levantasse e pegou a ponte que levava para o parque. Já passavam das dez. O caminho era escuro e sua única companhia era sua sombra trêmula e algumas cigarras. A ponte devia ter cerca de 1km, mas ela estava acostumada com sua extensão. A estação de trem ia ficando cada vez mais pra trás. Seus passos no chão acimentado eram ásperos e solitários. A bolsa parecia pesar mais agora, mas com certeza era só o peso de um longo dia de trabalho. O vento uivou mais forte e uma lâmpada a seu lado, no gramado da beira da ponte estourou, sobressaltando-a. Ela deu um leve pulo para a esquerda e sentiu o coração pular uma batida. Se concentrou e voltou a andar. Ainda deviam faltar uns bons 700m. Ela só queria chegar em casa. Seus pés a estavam matando, só queria um bom banho e sua... Schps. Um silvo. Ela não parou de andar, mas olhou