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Mostrando postagens de julho, 2010

Arranha-me.

A vitrola arranhando o vinil de Smith. Corpos mornos e lânguidos entre as mesas, movimentando-se melodiosamente. Cervejas não tão geladas em copos gordos, pedaços de porco frigindo nas panelas. Cadeiras e mesas rústicas, lígneas, firmes, bem como as pernas de muitas das moças dali que expunham os belos corpos em curtos shorts. Cabelos longos e molhados de suor. Rapazes sentados com as pernas abertas. Moços erradamente abotoados. Cabeças no ritmo da canção. Chapéus abanando os pescoços delgados e escorregadios. Sorrisos felinos. Noite estalada, quente. Corpos abusadamente carnais. Ps.: WTF?! Ps.: Baby, It's You, from Smith. Natália Albertini.

Rosto rasgado.

Abri os olhos, esfreguei-os com mãos sonolentas. Ouvi a voz de minha mãe ao telefone, sozinha e com toques alegres. Franzi o cenho e me livrei das cobertas. Levantei da cama e deixei o quarto. A sala estava clara, com as luzes acesas. Estranhei. Assim que ela me viu, abriu-me um belo sorriso com seus dentes pequenos e perfeitinhos. Os olhos se encheram, os cílios se iluminaram. Ainda ensonada, não conseguia distinguir bem com quem e o que ela falava, mas não pude conter que meus lábios fossem dedilhados por um sorrisinho de canto, embalado pelo dela. Desligou o telefone. Com o cabelo revirado e o cenho ainda franzido, interroguei-a com um gesto de cabeça. - Seu vô melhorou, Ná! Ele tá ótimo! A gente vai lá na casa dele agora! Olhei no aparelho de DVD na estante. A fluorescência azul indicava três e vinte e cinco da manhã. - Agora? - indaguei. - Sim! - É, filha, agora! - a voz de meu pai vinda da cozinha. Desnorteada, mas surpresa de uma ótima forma, me contentei. Meu corpo tratou logo

Não pare, menino.

A enfermeira nos chamou. Comecei a percorrer aquele corredor hospitalar ao lado de minha mãe, com a etiqueta em minha camisa listrada. Dobramos à esquerda. A moça nos pediu que higienizássemos as mãos na pia à parede. Ao virar meu corpo para fazê-lo, o vi. Vi meu avô atrás daquela fina parede de vidro, sentado na cama, com os olhinhos apertados e o peito recoberto de fiozinhos, sondas e adesivos. Primeira onda. Cerrei meu maxilar e me forcei a engolir as lágrimas, enquanto ouvia a voz de minha tia ressoando em minha cabeça "tentem não chorar perto dele". Terminei de lavar minhas mãos e as enxuguei, tentando reunir o máximo de forças possíveis antes de entrar naquele quarto. Entrei. Ele me atraiu como um ímã. Me aproximei com rapidez e delicadeza, dobrei o corpo sobre a cama inclinada e lhe dei um beijo na bochecha direita, agora tão pálida. Minha mãe fez o mesmo do outro lado da cama. Ele pediu nossas mãos. As demos. Respirando fundo, ele nos olhou aos olhos e disse bem baixi

Violões.

Sentia o mármore gélido e branco sob suas pernas, e o gesso, esbranquiçado e esquálido, tocando suas costas. Os dedos dedilhavam, ágeis, as seis cordas do violão, fazendo-o expelir aquela melodia serena e pesarosa. Seus olhos eram pálidos, indiferentes, cinzas. O cabelo caía aos olhos, dando à visão a penumbra tão condizente ao momento. O corpo do rapaz respirava imperceptivelmente, no ritmo das notas. Era possível ver as partituras tatuadas nas paredes. A camisa xadrez que lhe cobria o corpo tinha os botões errados. Perdiam uma ou outra casa. Ao redor daquele músico, os corpos já sem alma. Sem sorrisos. Sem lágrimas. Sem suspiros. Cem. Ps.: nem me perguntem... Natália Albertini.

Y vamos por todos!

A escola vazia e a rua movimentada. Uma das garotas estava sentada, anteciosa à tela do computador, enquanto a outra tagarelava sobre algo desimportante. Foi então que uma melodia conhecida desabrochou nas caixas de som do rádio. As duas moças se olharam e instintivamente se posicionaram. A que já estava de pé, de cabelos cheios e claros que lembravam os da cantora, começou a cantar a música, tinha a letra de cor, e a interpretá-la. O refrão irrompeu e ambas iniciaram de forma despreocupada a coreografia. Pulos, sorrisos, jogadas de cabelo e movimentos ensaiados. Uma terceira garota, falando ao celular, do lado de fora da escola, olhou para a dupla dançante e, apontando, riu alto. E até o final da música, as duas continuaram mexendo os corpos em sincronia, envoltas por divertimento e despreocupação. Os dois signos de fogo rodeados de chamas. Ps.: É... Waka Waka by Sagitário e Áries, beigos. Natália Albertini.

Stay away.

Essas minhas pálpebras pesando pela primeira vez em semanas. Esse Coldplay tocando incessavelmente no meu iTunes. Esses cachos gelados que, embora presos no alto da cabeça, me tocam a nuca. Todo esse desespero pra chegada do segundo semestre. Tudo isso só me mostra o quão ansiosa estou para ver o tempo escoar por meus dedos. E pra me distanciar o máximo possível, emocionalmente, de tudo e todos. Distância... Acho que é tudo que me falta. Natália Albertini.

Dá pra imaginar como é.

A mesa revestida por uma toalha branca trabalhada em vermelho. Xícaras delicadas de porcelana sobre pires sutis. Uma garrafa de Coca-Cola e um bule de café. Um açucareiro. Fatias de pão de nozes, crústule e broas de fubá. Mãos sorridentes avançando para aquelas guloseimas e bebidas. Gargalhadas e reprimendas sendo expelidas simultaneamente. A cozinha de azulejos brancos transbordava vozes que se sobrepunham de maneira teimosa. Família italiana falando durante o café da tarde. Dá pra imaginar como é... Ps.: adoooro! (: Natália Albertini.

Bloody Tango

Ele a arrancou brutalmente da mesa à qual estava sentada, puxando-a com agilidade, grudando os corpos. Abstiveram-se de sorrisos. Fuzilavam-se, comiam-se, devoravam-se com os olhos. Viradas bruscas, ganchos e passadas longas. Dançavam os dois um tango de rebeldia e obediência, de raiva e amargura, de violência e elegância. A noite ia escura, afagando as faíscas de ambos. Continham a respiração, recusando-se a parecerem cansados ao outro. Queriam provar sua força. Ela, com seus encaixes perfeitos. Ele, com a força com que a guiava. Ele parou repentinamente e a arremessou ao chão. Ela ficou ali. Viu no espelho seu reflexo vestindo o vestido vermelho bem decotado, o cabelo puxado ao alto da cabeça num coque, os olhos escuros e a boca pintada. Sua imagem ofegava, o peito subia e descia em intervalos curtos. Os olhos foram mais à direita no espelho. Enxergaram o reflexo dele se afastando. E por fim ela se encontrou sozinha em seu quarto. Mais uma vez. Ps.: ao som de El Sonido de La Milonga,

Minhas cicatrizes.

Ao som de John Mayer, me peguei perscrutando-me. Meus dedos da mão esquerda acariciavam inconscientemente uma pequena cicatriz em meu pulso direito. Me peguei pensando em quanto gosto do meu corpo. Não, fiquem tranquilos, não é nenhum momento narcisista, até porque estes me estão em falta ultimamente. Estava simplesmente me dando conta de quão importante é nosso corpo. Eu, escritora ávida que sou, percebi que escrevo a todos os instantes. Um simples movimento de cabeça pode traduzir três ou quatro palavras. Imersa nessa reflexão, chequei o quanto meu corpo é capaz de armazenar. Entendam, tenho eu algumas cicatrizes de quando criança espalhadas pelas pernas, pulsos e até mesmo uma sobrancelha, que me recordam minhas primas, as festas de aniversário na casa de meus avós. Tenho, do lado esquerdo do corpo, duas áreas arroxeadas - uma no braço e outra na cintura - que me fazem lembrar da noite passada. Ainda pela cintura, mas na metade direita, tenho uma cicatriz de mordida que me acompanha
Rotina. Rotina. Rotina. Morte. Ps.: Já comentei que rotina pra mim é sinônimo de morte? Natália Albertini.