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Mostrando postagens com o rótulo Pensamentos Aleatórios

Caro doutor.

(Disclaimer: esse é um rascunho meu de 2016. Achei bobo e puro. Não quis mais guardar. Vá.) - Sabe, doutor, eu tenho tido essas bolinhas na cabeça. - Ah, é mesmo? Deixe-me dar uma olhada. Ele levantou e começou a revirar os cabelos dela. Voltou pra mesa com um ar de grave preocupação. - Doutor, o que foi? Ele escrevia fervorosamente uma receita e já não a olhava. Apertou um botão que ficava na ponta de sua mesa. Duas enfermeiras entraram. - Doutor, o que é isso?! - a mais pura agonia - Você está começando a pensar, minha cara. Pare. Uma injeção na coxa. Escuro.

Nair.

Ela dirigia uma Spin. O banco bem puxado pra frente, pra alcançar pedais e volante. Tinha um celular Android e o aplicativo da 99Taxi. Chamava voucher de "vaut" e tinha um anel no dedo anelar da mão direita - não sei dizer se era uma aliança, nunca fui boa em diferenciar isso. Sua pele era escura e suas mãos, pequenas. Seu cabelo ia curto, até um pouco rente à cabeça, e seus olhos eram jabuticabas, mas daquelas que ainda não adoçaram. Não confiava no GPS, mas tinha São Paulo na palma da mão. Não puxou muita conversa, mas também não ficou muito calada. Nos levou daqui até ali, reconhecendo cada rua, até mesmo aquela tal Relíquia. Queria saber onde mora Nair. Queria saber se tem filhos, se gosta de tomar café ou que cor acha que vai bem com sua pele. Gosto de imaginar, contudo, que chega sempre em casa tarde da noite, porque dirige um táxi de madrugada, que seus dois filhos, Bruno e Débora, deixam sua janta pronta no micro-ondas, e que a foto do pai deles ...

Nenhum.

Tenho em frente a mim uma luminária antiga, uma Barbie Ariel ainda na caixa, um cofrinho do Pluto que uso desde minha quinta série e uma ovelha que comprei na viagem a Gramado. Ah, e, claro, meu celular emitindo músicas de uma playlist do Spotify que escolhi (meio melancólica, devo admitir). Tenho pensado em por que me leva tanto tempo pra voltar aqui pra escrever. Acho que tem algo a ver com o fato de que toda vez que abro esse blog, me sinto nauseada. Sinto como se precisava chorar, vomitar, continuar lendo até chegar no osso, sem parar de chorar e me mutilar. Parece que entro de cabeça num mar gelado e denso, com as mesmas palavras de sempre, com os mesmos sentimentos e mesmos ângulos. Aliás, acaba de me passar pela cabeça que talvez eu devesse guardar esse aqui numa caixinha e inaugurar um blog novo. But that's not how life goes, right... Would that be cheating? I have no fucking clue... Eu perdi a prática de escrever. Quer dizer, nem sei se algum dia prestei pra is...

Marshmallow

O dia era bastante frio pra uma manhã de maio. Uma chuva fina e insistente batia nos vidros do carro, como se um domingo já não fosse tedioso por si só. Todavia, aquela domingo não ia tão monótono assim... Ele dirigia e defendia suas opiniões com afinco dentro daquele casaco grande de náilon. Seu tom de voz era amadeirado, melodioso aos ouvidos dela, que prestava bastante atenção no que ele dizia. Prestava mais atenção, com tudo, no jeito como ele falava. E em como ele ficava bem de barba. Não conseguiu se conter e, por algumas vezes, arrumou um ou outro fio que destoava. Debaixo do queixo dele, ou mais perto da orelha, quase à altura dos óculos, onde aquela barba densa se juntava com o cabelo que ele agora tanto aprovava. Barba e cabelo, ambos do mesmo tom, mas os olhos... Ah, os olhos, não... Estes tinham uma cor ainda mais doce, quase caramelo. E ela realmente gostava de como esse caramelo escorria por sua pele quando ele a encarava. Ela sorria bastante e concordava com quase...

Um Outro N.

Ela estava a meu lado direito, com um copo de cerveja em mãos, num gesto espelhado ao meu. Conversávamos sobre alguma amenidade passada em mais um dia de escritório. Ela tinha o cabelo repicado, e os olhos densos, cheios de experiência, apesar da pouca idade. Tinha também um ar meio sarcástico, que me fazia lembrar alguém... O ambiente era barulhento, porém mais claro que de costume. Como sempre ela tinha alguma peripécia pra me contar, situações que chamávamos de "Natalhisses". Experiências que só nós duas poderíamos entender, afinal, o nome só nos pertencia. E, mais do que isso, éramos a perfeita personificação do tal. Ela me fazia rir muito. Nos conhecemos há pouco mais de um ano, mas a sintonia agora era tamanha que... Me espantava. Não éramos melhores amigas, porque a definição disso que normalmente nos vem à cabeça é alguém que te conhece há muitos anos e com quem você já partilhou muita bagagem. Esse não era o caso ali. É só que... Entre aqueles copos de ce...

Laranja.

O barulho lânguido da água se acalmando e a luminosidade escassa me envolviam. Acima da superfície, somente meus olhos. Abaixo, o corpo inteiro imerso naquela massa morna e líquida. Ao longe, o som dos animais notívagos se escondendo em arbustos. Observei o topo do manto de água balançar devagar. Afundei e olhei à direita. Um enorme e majestoso crocodilo me encarava, preguiçoso. Seus olhos brilhavam arroxeados, e a cauda jazia estática. À minha esquerda, mais deles se aproximavam, nadando rápido, assustados. A massa de água me empurrou inevitavelmente para mais perto de onde o primeiro deles deitava. Ao tentar me esquivar, percebi que ele já havia fugido também. Com toda a rapidez que se pode ter no ambiente submerso, voltei à esquerda. Das profundezas daquele canto, a água se deslocava ainda mais rápido e mais forte, me empurrando, e dois pontinhos alaranjados, mais brilhantes que o dos crocodilos, se aproximavam numa velocidade nauseante. Tomei impulso nos azulejos atrás d...

Vocês se amam? Pra sempre? Jura?

Sou só eu que me sinto plenamente satisfeita quando o relacionamento de um casal termina? Não, gente, não é maldade, eu não sou fria e calculista e, sim, tenho um órgão bombeador de sangue também. É só que acho tudo muito interessante. Não sou adepta do sentimentalismo exagerado. Na verdade, já senti repulsa pelo simples tom sentimental emitido por algumas pessoas. Hoje sou mais tranquila com isso. Mas o exagero e a irrealidade com que esses sentimentos são expostos ainda me incomodam bastante. E, claro, se pronuncio esse tipo de coisa em voz alta, olhadas tortas e proferição de palavras ruins são expelidas com prontidão. Entretanto, não mudo minha perspectiva. Eu não acredito em amor eterno. Isso não quer dizer que eu seja má, que eu não tenha um pingo de esperança na vida ou que nunca vou encontrar um pra mim, que nunca vou mudar de opinião. Mas por enquanto, não acredito. E nada me faz acreditar. E não tenho vergonha de proclamar. Ainda acho uma grande besteira quando alguém me fa...

Verme.

O trem metálico deslizava pelos túneis escuros, silencioso. Eu tinha a cabeça encostada no vidro, séria. Um cheiro acre me chamou a atenção. Farejei algo diferente, com certo nojo. Não precisei correr os olhos pelo vagão, de cara o vi parado no meio do corredor, fixo. Devia ter por volta de um metro e meio de altura. Sua pele era translúcida, seus cabelos, pesados e negros, e os olhos verde-escuro, de pupilas dilatadas. Tinha manchas vermelhas e arroxeadas na região dos cotovelos e da nuca. Sua aparência era debilitada, doente, embora o sorriso contido não desgrudasse seus lábios desbotados. Ele não me olhou diretamente, mas eu sabia que havia me visto e era isso que o fazia sorrir. Endireitei o corpo e senti meus lábios arquearem-se sobre meus caninos em repulsa, despropositadamente. Um demônio num corpo de um menino. They were back in town. Pensei que precisava avisar Andreas o mais rápido possível, mas isso foi só um vislumbre de pensamento, pois o cheiro daquele verme, súdito do ve...

Aterrisagem de emergência.

Respirei fundo. Cerrei as pálpebras, certa de que um oceano me subiria aos olhos. Errei. Não subiu. Inspirei mais uma vez e soltei o ar devagar. A consciência de que toda a euforia das últimas semanas foi mera ilusão pesa sobre meus ombros. Pode ser que amanhã eu acorde e me iluda novamente, pode ser que ache que estava louca hoje, assim como neste momento acho que ontem estava maluca. Nesse pequeno e novo âmbito da minha vida, o qual me recuso a nomear, as tentativas têm sido em vão, tudo ainda me parece artificial e sempre sinto que o universo não me dá em troca com tanta paixão quanto eu. É, e mais uma porta se fecha. Dizem que deve-se tentar todas as portas, afinal, uma delas há de estar aberta. E se eu não quiser isso? Acho que por enquanto tenho a simples vontade de continuar nesse corredor imenso sem forçar qualquer maçaneta. Detesto acima de tudo meus momentos de desilusão e aterrisagem no mundo real como este, mas me são naturais e intrínsecos. De teimosa que sou, sigo desilu...

Rock. And. Roll.

O barulho da multidão era espalhafatoso, ouriçado . Ele pulou com um pé de cada vez e olhou para o palco, ali detrás dos panos, pronto, esperando para sua entrada triunfal. O instrumento vibrou, tão ansioso quanto o público. Chacoalhou a cabeça com os olhos apertados. Virou pra trás e viu os colegas relaxando o corpo, se alongando e respirando mais fundo, o de sempre. Voltou a olhar a iluminação do palco, sentiu na pele a ansiedade das quarenta mil pessoas ali, próximas, e fez uma das cordas da guitarra vibrar. A multidão foi ao delírio. Olhou para os companheiros, esperando a confirmação de cabeça de cada um. Todos pronto. Respirou fundo. Outra vez. Disparou para o palco, onde quase não ouvia o som da própria guitarra, mediante aos gritos de clamor daquela multidão. Rock and roll . Ps .: Whitesnake foi! *-* VEM, SYSTEM ! Natália Albertini .

Cevada

Abriu a lata de cerveja: infortúnio. A maldita estourou em suas mãos, esparramando aquela espuma ansiosa pelo chão, sujando-lhe os dedos, melecando -os. Os amigos zombaram dela e ela, despreocupadamente , riu junto. Colocou a lata no banco ao lado, pedindo para que jogassem fora, e foi ao banheiro lavar as mãos agora lambuzadas. Empurrou a porta do estreito e mal iluminado metro quadrado que se tinha a pachorra de ser chamado de banheiro ali, à procura da pia. Antes que conseguisse enfiar-se dentro do pequeno local, outro corpo colou-se ao seu e a empurrou, fechando a porta atrás de si. Ela foi prensada contra a bancada da pia, seus ossos à cintura, do quadril, pressionados contra a pedra fria, seu rosto de frente para o espelho, ao lado do dele. Ele era mais alto e mais forte. Com uma das mãos lhe segurava pelos cabelos e com a outra, trancava a porta. Ela sorria, os olhos já semi-cerrados devido ao álcool. Ele tinha os dele completamente fechados, envolto na atmosf...

Energyless

Ela andava despreocupadamente, com seu gingado habitual, balanço os lisos e curtos cabelos escuros. Sibilava a letra da música que ouvia. Chegou ao terminal de ônibus. Escuridão. Ela arqueou as sobrancelhas e diminuiu o passo, colocando a bolsa mais à frente do corpo. Logo entendeu que a região encontrava-se sem energia. Esquadrinhou o ambiente, apertando os olhos, adaptando-os ao escuro. A claridade do dia já se esvaía por entre as nuvens, mas ainda ajudava a dissipar - ainda que minimamente - o preto generalizado. Os vultos iam e vinham, andando com cuidado para não se esbarrarem. Ela apertou o passo de novo e começou a atravessar o escuro, em busca da outra extremidade, onde a luz do dia, ainda que rala, a ajudaria. Uma voz feminina vindo dos fones sussurrou low battery e desapareceu. Até seu próprio iPod a abandonou. Ela passou a andar ainda mais rápido. Mantinha os olhos à frente, como se usasse o próprio cabelo de cabresto, não ousava olhar para os lados. O escuro ainda era o qu...

Sardas.

Saia de cintura alta, camiseta de manga três quartos, botinas e jaqueta de couro, bolsa tamanho exagerado, óculos escuros, fones de ouvido brancos e livro numa das mãos. Eu ouvia Vampire Weekend , entretida. Olhos. Olhos à minha cintura. Detectei-os à minha esquerda. Com os pés fixos ao chão do metrô em movimento e uma das mãos segurando firmemente um apoio, virei o rosto para a fonte dos olhos. Nada. Ninguém me olhava. Os olhares pareciam ter vindo de um corpo masculino bem formado aos ombros e ao ( hmmm , e que ) pescoço e de um rosto incógnito, já que a cabeça estava abaixada, ocupada em ler um livro com figuras de arte barroca. Vi somente uma boina cinza encobrindo a cabeça indecifrável . Dei de ombros. Voltei a encarar as janelas do metrô . Olhos. Olhos à minha cintura. Desta vez, fui mais rápida. Virei o rosto novamente. Choque. Ele me encarava. E era lindo. Tinha a pele muito clara, com algumas poucas sardas, cabelos alaranjados, bem como os cílios, e olhos adocicadamente ve...

Florida

She had her back on the wall . She was sitting on the bed , which was covered in white . Her legs were long and naked . The hot Florida air made her wear nothing but panties and one of his big baseball shirts . He was almost falling asleep on her lap , his eyes were light green and his eyelashes , deeply blonde . She had a book in one of her hands , while the other one had its fingers on his yellow and straight hair . He stretched his body , half naked as hers , but on the top part of it , and found a new and better position for his head above her soft legs . Almost voiceless by the tiring hot weather and the sleeping atmosphere , seconds before falling asleep , he whispered , unconsciously : - Don't let me go . She heard . She laid down the book , smiled with affection and got down , putting her face right in front his , almost gathering their lips . She whi...

Fúria.

Acendeu seu Zippo e pôs fogo na ponta daquele penúltimo Pall Mall . O vento fazia a neve atirar-se ao chão rodopiando em volta daquele amontoado de casacos. Tory estava ali, recostada à mureta , em jeans e coturnos , sob um imenso capuz que cobria seus cabelos e olhos quase tão escuros quanto a própria noite em volta de si. Não fosse pela luminosidade do cigarro, seus contornos seriam imperceptíveis ali. Deu uma tragada e ficou a apreciar o gosto, segurando o palito nos dedos magros, entre o indicador e o médio. Tão silencioso quanto ela, ele surgiu à sua frente. Ela não lhe ergueu os olhos, só terminou o cigarro e jogou o inaproveitável no chão, apagando-o com o solado do coturno . Enfim se olharam. Bruce lhe entregou um par de chaves. Suas peles não se tocaram. Ele era mais alto, chegava a quase 1,90m. Vestia um enorme capuz também, mas seus olhos eram acinzentados, embora tão raivosos quanto os dela. Manuseando o Zippo como de costume, deixou-o para trás e caminhou até a Ducat...

Os lápis.

Eu estava sentada num dos bancos verdes do metrô , relendo um de meus livros favoritos. Tinha o cabelo bagunçado , como de costume, os fones brancos nos ouvidos e os óculos de sol ao topo da cabeça. Os cílios iam longos, movendo-se minimamente, lendo com ânsia nostálgica as páginas de um livro que há muito a havia encantado. Percebi um movimento constante e frenético à minha diagonal direita. Discretamente, olhei. Vi um rapaz, que deveria ir lá a seus bons vinte e cinco anos, sentado, com a mochila aos pés. Às mãos, tinha um bloquinho de papel e um lápis de desenho. Sua mão direita ia e vinha em rabiscos de grafite. Conjurei sobre o que ele poderia estar a desenhar. Assim que subi os olhos aos seus, entretanto, entendi. Esforcei para não explicitar que eu o olhava e que percebia o que fazia. Vi, então, que ele me desenhava. A mim, uma pessoa tão comum, lendo, quieta, lhe havia despertado a imaginação, incitando-o a desenhar. Voltei a ler e não retornei meus olhos aos seus, mas perce...

Quatro asas.

Livros, cadernos, lápis e canetas scattered on the table . Bzzzzzzzzzz . Ela estudava arduamente. Bzzzzzzzzzz . Escrevia, lia, anotava, relia, falava sozinha e escrevia mais um pouco. Um post - it aqui e um marca-páginas ali. Bzzzzzzzzzz . CAZZO ! , ela pensou enquanto procurava pela maldita abelha! na cozinha. Achou-a voando ao redor das três lâmpadas fluorescentes . Angustiada e brava, simultaneamente , com o zunido incessante daquele inseto , encarou a pequena abelha furiosamente. Bzzzzz...zzzzzz...zzzzzzz. Foi quando aquela minúscula bolinha amarela e preta sentiu suas asas falharem por alguns instantes e começou a girar no ar, caindo na direção dela, à mesa. Caiu, impotente, a seus pés, sem conseguir levantar voo do chão. Ela sorriu de canto, divertida com o acontecido, e bateu com o chinelo sobre a zunidora do inferno! . Duas ou três horas depois, ela continuava à mesa, persistente em seus estudos. Tiriti . Lia mais um pouco, anotava nos livros. Tirititi . Colava os post -...

Ela queimava.

O ambiente era iluminado somente pelas três ou quatro velas acesas, avermelhadas. Ela estava sentada ao meio do cômodo , só de calcinha e uma regata branca. Os cabelos iam bagunçados , confusos, assim como sua mente. Era rodeada por cartas escritas numa caligrafia corrida e não muito caprichada. Ela lia e relia aquelas palavras já tão conhecidas às duas e meia da madrugada daquela quinta-feira. Coçava a cabeça, passava as mãos pela cintura, lambia os lábios. Os olhos queimavam junto com a tequila escorregando sua garganta. Cada gole servia para calar sua boca. Por fim, se levantou, meio embriagada, vestiu seus jeans e chinelos. Jogou o resto da tequila em toda aquela papelada. Alcançou seu maço de cigarros ao chão. Pegou um palito de nicotina e o acendeu com seu Zipo . Então, jogou o isqueiro às cartas e deixou o apartamento. Todas as cartas que ela nunca mandou estalavam ao fogo. Ela queimava. Natália Albertini .

Bandeira vermelha.

No ônibus , estava sentada a um banco ao lado da porta de trás. Vestia uma saia que lhe ia até o meio das canelas, preta, meio enrugada, que lhe avolumava os quadris e ressaltava-lhe as pernas. Um sapato de meio-salto e uma regata vermelha. Nada às mãos, exceto alguns anéis e pulseiras. Os olhos longínquos miravam o sol. Do primeiro banco, levantou-se ele. Caminhou até a porta traseira. Era alto, vestia calça risca de giz, cinza, e camisa meio aberta, preta. Os ombros cresciam largos, e os antebraços deixavam veias à mostra, bem como pulsos brutos. O pescoço subia rude, rasamente barbado. O maxilar ia largo, quadrado, e os olhos... Bem, os olhos prenderam-se nela por alguns instantes, sem fazê-lo perder o equilíbrio, contudo. Ela tomou consciência da figura altiva, e fez com que os olhos se resvalassem, faiscando, propositadamente. Por cima do ombro direito, ela percebia que ele a olhava incessantemente de soslaio. Ela, satisfeita, sorria de canto, sem lhe dirigir outro olhar, orgulh...

Alongamento.

Encostada na parede da sacada, sentada ao chão, com o computador no colo, os dedos alongados digitando palavras descrevendo a si mesmos, metalinguísticos, envolvidos naquela mísera garoa praiana. Os cachos, entretanto, pensavam milhas longe dali, universos paralelos. Natália Albertini.