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Mordedor.

Ele tinha os cabelos escuros e pesados, um travesseiro para meus dedos. Os olhos, embora ele não gostasse, docemente esverdeados e fixos na animação que passava na TV. Algo sobre animais de zoológico querendo fugir com o circo. Ele havia se aninhado em meu colo e sua cabeça repousava ali. Seu peito subia e descia numa respiração ritmada e tranquila. Eu o olhava com enorme afeição. Um sentimento que tendia a me transbordar pelos olhos e me apertar a garganta. Ele virou o rosto e aqueles olhos que me afogavam como um rio faminto me encararam, curiosos como os de um menino. - Que foi? - é claro que ele estranhou meu encantamento, eu devia ter ficado quase dez minutos encarando sua beleza. - Ah, nada - respondi. Ele levantou a mão direita e me apertou o nariz, num gesto de carinho. Voltou a atenção à TV. Eu sorri e engoli minhas lágrimas de carinho. A única pessoa do mundo que expressa amor por meio de lágrimas, e ele escolheu bem a mim. Meu coração se retorce de felicidade ao

Macio.

O sol ia alto no céu naquela manhã. O cheiro da maresia e de protetor davam o clima. As ondaa batiam ansiosas nas pernas de todos aqueles que iam saudar o mar. Escutava conversas, sem ouvir exatamente o que se falava. Estava de bruços na canga, o cabelo molhafo às costas, o sol lhe lambendo as espáduas e a cintura, o calor fazendo a pele macia e bronzeada. Um sorriso aos lábios. Sua projeção de futuro era tão longíqua quanto o que iria comer no almoço. Ps.: vem, férias! :( Natália Albertini

Cabana.

O sol matinal se espreguiçava pelo chão do cômodo. O sofá-cama jazia quieto, sob o ventilador que rodava lânguido. Ele dormia calmo, uma coberta fina sobre o corpo, e um semblante de quem sonhava longe dali. E em paz. Já batiam quase nove horas. Me aproximei e sussurrei bem baixinho que acordasse, a manhã já batia à janela. Meus cachos se estenderam por cima de sua cabeça, imergindo-nos naquele local secreto que só nós dois poderíamos ver. Beijei a pintinha em sua pálpebra direita, ainda fechada e sonolenta. Ele se alongou devagar e demorou a abrir os olhos, mas quando os abriu, fixou-os logo em mim. Eu não podia fazer menos que abrir um sorriso que pudesse abraçá-lo por inteiro. Ele, ainda meio sonhando, me agarrou a mão esquerda e a pôs debaixo de seu travesseiro, como para que não fugisse. Em pensamento, disse que não. Não vou fugir. Da sua, Natália Albertini.

Laranja.

O barulho lânguido da água se acalmando e a luminosidade escassa me envolviam. Acima da superfície, somente meus olhos. Abaixo, o corpo inteiro imerso naquela massa morna e líquida. Ao longe, o som dos animais notívagos se escondendo em arbustos. Observei o topo do manto de água balançar devagar. Afundei e olhei à direita. Um enorme e majestoso crocodilo me encarava, preguiçoso. Seus olhos brilhavam arroxeados, e a cauda jazia estática. À minha esquerda, mais deles se aproximavam, nadando rápido, assustados. A massa de água me empurrou inevitavelmente para mais perto de onde o primeiro deles deitava. Ao tentar me esquivar, percebi que ele já havia fugido também. Com toda a rapidez que se pode ter no ambiente submerso, voltei à esquerda. Das profundezas daquele canto, a água se deslocava ainda mais rápido e mais forte, me empurrando, e dois pontinhos alaranjados, mais brilhantes que o dos crocodilos, se aproximavam numa velocidade nauseante. Tomei impulso nos azulejos atrás d

Meu.

O barulho no apartamento era alto demais, o anfitrião talvez até recebesse uma multa por isso. O ambiente, contudo, era delicioso. Vozes animadas, clipes na TV e muita comida e bebida à mesa. Já passavam das três da manhã, e seu organismo que ainda se comportava como o de uma criança clamava por uma cama. Tinha, entretanto, o melhor travesseiro sob sua cabeça de olhos já fechados: o ombro direito dele. O ouvido direito dela captava todo o som da festa, animada demais para aquela hora da madrugada na opinião dos vizinhos. O esquerdo ouvia com carinho as batidas do coração dele sob a polo preta. De cada lado da cabeça, um extremo: bagunça e tranquilidade. O corpo que se fazia de cama para ela se mexia um pouco, suas cordas vocais vibravam com um tom divertido. Ao mesmo tempo, o braço direito dele a envolvia, acariciando suas costelas e espáduas. O mais puro afeto a inundou. Ela o abraçou mais forte. Sentia que... Não. Ela sabia que, se quisesse, poderia dormir naquele ombro p

Algo bom. E alto.

- Quero ouvir algo bom. E alto. Ele parou no farol e selecionou a banda preferida deles. Aumentou o volume até os vidros do carro tremerem, até suas veias pulsarem com mais força, até ver as feições satisfeitas dela, traduzidas num sorriso que ele adorava. Os acordes pesados, rock do melhor, vibravam incontroláveis. Eles urravam as letras. As cabeças chacoalhando, o carro perfurando a noite com aquele volume estrondoso de guitarras. Os faróis dianteiros iluminavam a avenida encoberta pelo escuro. Algumas almas nas esquinas, encarando a fonte do barulho alto demais. Um estranho na noite. Lá dentro, eles continuvam cantando as letras rápidas e trabalhadas demais. Ele tinha a mão na perna esquerda dela. Ela, o coração na boca. Natália Albertini.

Colorido.

O cômodo silenciava, escuro. Nenhum aparelho ligado, nem emitindo som algum. Flashes da noite viscosa e vermelha. Preto. Verde. Roxo. Vermelho. E mais vermelho. E ainda mais vermelho. O visco daqueles pescoços latentes era provocativo demais. Ela sabia que deveria parar, mas era incapaz. Se esguiava pela pista de cança pelas sombras, deixando somente alguns trechos daqueles focos coloridos de luz lhe tocarem, no máximo, o braço. Voltou a si. As pernas iam cruzadas no chão, os braços, atrás do corpo, dando suporte a toda sua gula. Sentiu uma gota do seu próprio visco avermelhado pingar em seu peito nu. Olhou pra baixo, observou-o escorrer. O que antes era apetite, agora transformara-se na consciência do abuso. Não deveria ter tomado tanto... Mais uma gota pingando. E outra no colo esbranquiçado e estufado. Encarou seu reflexo no vidro logo à frente. Sua face pálida, seus olhos fundos. Seus lábios gelados. Sangue escorria pelo meio deles. Muito sangue. Todo o san

Soulsick

In spite of it all, I'm still soulsick. Yeah, have you heard of it? Oh, it is terrible. It eats me alive.  And I've heard it won't heal. Not even with time. Joy has slowly come back to me, found some abandoned rooms to live in. It brings me to life in most of the days. But then there are these dark, cold and rainy days, when world seems to be just a big old monster that makes you shiver with every step it gives. Part of my soul is as black as night, as cold as winter and as dead as a corpse. Nope, na-na-no. It is not dead. Oh, no, my friend, it is alive.  By a thin line, but it is alive, because it still hurts. And the pain gets bigger than any room full of joy i may have rented. I see world in blue, green, yellow, pink, purple, red, and then... Colors start to fade, then it's all gray and dark again, then my feet lose ground and my head loses me. Then I'm a hurt creature, screaming and moaning in deep agony. My screams could scare little children.  Oh, da

Veludo.

Ela corria. As gotículas daquela chuva morna caíam-lhe ao rosto. A capa de veludo verde escuro ondulava às suas costas, o capuz tapava-lhe os olhos a cada passada. Os galhos estalavam a seus pés, as árvores a observavam, serenas e notívagas. A noite pesada preenchia o bosque. Ela sentiu o cheiro do rio gelado mais à frente, correndo como ela. Alargou ainda mais os passos, esquentando o corpo que horas antes tremia de frio. Alcançou, por fim, a margem daquele corpo lânguido e azul. Escuro.  Ela agachou, ouvindo os gritos cada vez mais próximos daqueles que a caçavam. Enfiou a mão no bolso direito com rapidez e segurança, sentindo o toque aveludado do tecido denunciando a chave escondida ao fundo. Determinada, deixou a chave escorregar de sua mão, mergulhando no rio gélido e imponente. A chave voltaria para ela, tinha certeza disso, quando mais tarde a procurasse. Para a mão deles, jamais. Pôs-se de pé, de costas para o rio, de frente para os homens que se escondiam a menos d

Número 1.

A porta se fechou com um baque atrás dele. O que os olhos castanhos dele viam eram os acinzentados dela. E aí, claro, desciam pelo pescoço delgado e o colo apetitoso num decote generoso. Jogou as chaves do quarto sem se importar onde cairiam. Trotou até a cama, arrancando a camisa ferozmente, exibindo os ombros deliciosos. Pegou-a pelos cabelos da nuca e lambeu-lhe o pescoço, enchendo a boca com as línguas. A crina escura e pesada dela corria pelas costas. Ele lhe arrancou a roupa com a velocidade e, principalmente, a fome de um lobo. Os sons emitidos por ambos eram tão animalescos quanto seus movimentos. A boca esbranquiçada de sede dele percorreu o corpo da criatura espalhada pela cama, sentindo a pele dela queimar-lhe a língua. A sexta tatuagem dele e a primeira dela movimentavam-se languidamente. Lamberam-se, morderam-se. Engoliram-se. Canibalismo viscoso. Natália Albertini. 

Dancing in the rain.

Ele olhava para a água caindo sobre sua cabeça e espirrando pelos azulejos. Ela o olhava encantada. Vidro separava os corpos postados de pé. Ela abriu a porta de correr, pisou no chão molhado e um pouco escorregadio e voltou a correr a porta para não deixar molhar o resto do cômodo. Ele sorriu pra ela, enlaçou-a pela cintura com o braço esquerdo e, com a mão direita, segurou a dela. - Vamos dançar - ele disse. Ela riu da ideia, mas se deixou levar pelos passos leves, molhando os cabelos enquanto dava as vagarosas piruetas. O banheiro girava em câmera lenta e a água caía morna. Seu estômago também rodopiava devagar, mas era uma sensação deliciosa. Ao fundo, o som da TV ligada no quarto sussurrava. O sorriso dos dois formavam luas minguantes. Ela desejou com força que ele a continuasse girando e girando e girando. Se apaixonou por aquela tontura. Natália Albertini.

613.

O quarto estava pacificamente escuro, as cortinas pesadas cobrindo a vista noturna. As únicas vozes que quebravam o silêncio eram baixas e falavam num outro idioma, vinham da TV, que também emitia uma luminosidade preguiçosa. Os lençóis grossos cobriam desordenadamente as pernas. Ela estava sem a camiseta, com o cabelo lhe cobrindo o sutiã. Os shorts ainda vestidos. Uma cerveja apoiada na cama. Ele só tinha a boxer no corpo e uma lata na mão. Seus olhos iam semicerrados, cansados de tanto ver a estrada pela frente; as costas sem postura, provavelmente reclamando da cama de hotel desconfortável. O sono o alcançava. Ela o admirou por um tempo, encantada mesmo depois de 2.800KM rodados naquela caminhoneta que haviam carinhosamente apelidado de Sophie. - Eu dirijo amanhã - ela sussurrou. Tarde demais, ele já dormia longe dali, nebulosamente sonhando. Ela sorriu e colocou as duas latinhas no criado-mudo de madeira escura, desligando a TV. Beijou-lhe a testa e o ajeitou na cama. Não o co

11.

- Pode chorar, eu estou aqui com você - ele sussurrou. Um par de faróis passou pela rua escura e deserta, iluminando o interior do carro dele. Ele a tinha em seu colo. Seu cabelo ia revolto, os olhos marejados e o lábio inferior protuberante como uma criança fazendo bico. Ele encarava suas feições agoniadas e iminentemente chorosas. - Pode usar minha camisa - ele insistiu - para enxugar as lágrimas. O pranto expeliu os olhos claros dela, sem maiores cerimônias, incapaz de ser contido. Ela não conseguia abrir a boca pra sequer explicar que era a pior pessoa do mundo em lidar com sentimentos. Eles eram naturalmente incompatíveis com sua forma física, não cabiam dentro dela. Sua única forma de reação a eles era exeplir água salgada pelos olhos e ficar com a cara inchada. Chorar. Chorar e chorar. Ela era do avesso e sabia. No caso dela, chorar significava algo bom. Temia, contudo, que ele se assustasse com aquilo e não entendesse que as lágrimas por si só revelavam um dos sentimentos mais

Chantilly.

- Só um pouco, tá? - Tá - ela disse, risonha. Ele trocou de marcha e abriu a boca, com a atenção ainda voltada para os carros à frente. Ela chacoalhou a embalagem cilíndrica que tinha em mãos, sorrindo, e a aproximou dele. Pressionou a válvula e encheu a boca do rapaz de chantilly ao ponto de ele não conseguir falar. Jogou a cabeça pra trás, rindo, deleitada com a brincadeira. Ele não conseguia engolir o leite batido de tanto que ria com ela. Seus olhos eram escuros, e ele os apertava quando ria. O sorriso dele era tão doce e espontâneo que a dava ainda mais vontade de continuar rindo. E de continuar ali, naquele carro, fazendo-o rir por muito tempo, até que os abdômes e os maxilares começassem a doer. E até que não houvesse mais asfalto para cobrirem. E até que não houvesse mais nada. Só eles e suas bocas cheias de chantilly . Natália Albertini .

Amarelo.

Tinha o pé no pedal do meio, o carro desengatado. Passavam das dez da noite e a chuva persistia, dando finas agulhadas no capô e nos vidros. Só o barulho dela como trilha sonora. O sinal ainda vermelho. Um mar indecifrável e agitado ondulava dentro de mim. Saudades. "De quê?" aquelas ondas sussurravam. Não sei. Mesmo. Saudades da 336. Saudades dos óculos grossos dele. Saudadas da gente unido. Saudades até mesmo do que eu tinha com aquele Peter Pan. Respirei fundo. O sinal para os carros que cruzavam amarelou. Engatei a primeira. A chuva ainda caindo. Eu ainda pensando, o mar noturno ainda me umedecendo por dentro. Os carros a meu lado partiram. Eu fiquei. Sem entender. Pra mim, o sinal voltara ao amarelo, e não ao verde. Por que eles seguem? E eu continuo aqui, engatada na primeira, mas sem conseguir tirar o pé do freio? E as ondas me sobem à superfície azul outra vez. Natália Albertini.

Suculenta

Ela começou a se vestir: pôs a calcinha e a saia branca de pregas. Ele a admirou por um tempo, ainda deitado, com os cabelos da nuca encharcados. Levantou num ímpeto e postou-se de pé, nu, em frente a ela. Enlaçou-a pela cintura e olhou o reflexo dos corpos dourados colados no espelho à direita deles. Os cachos compridos e claros cobriam os seios bem definidos dela. Ela encarou o reflexo dele. Os olhos do rapaz percorriam suas coxas, cintura e seios, ainda faminto. Por fim fixou-os nos olhos dela, acinzentados. - A gente forma um casal bonito - ele deixou escapar. A palavra "casal" não lhe causou arrepios como antes. Sorriu mediante aos desejos dele. Ele jamais a teria, ela era inatingível, e era isso que a tornava tão suculenta. - Claro que forma - ela respondeu numa voz rouca e em lábios avermelhados e aveludados. Beijou o queixo robusto e barbado dele. Os olhos dos dois reflexos não se desgrudavam, vítreos. Hipnotizado. Mais um. Ela engoliu a própria saliva, que, ao escorr

Ensolarados.

A estrada livre à frente do carro. O cheiro de mato dançando na serra. O Sol se esparramando pelo painel. Minhas pernas quase douradas dobradas sobre a mala aos meus pés. Meus cachos, intempestivos, esvoaçando a frente de meus óculos-de-sol. Ele dirigindo, sibilando a letra da música ao raído, com seus óculos exagerados. Ela, de cabelos longos, encostada ao banco, tranquila. Atrás de mim, ele olhava pela janela. O carro cheio de malas, nos apertando. Nós quatro voltando para a vida real. Nós quatro. Nós. Ps.: and what I feel for you, my dear friends, does not have a name. Natália Albertini.

Vitória Régia.

- Quer ir pro mar? - ele perguntou, olhando-a aos olhos. Ela deu dois passos para trás, em direção às ondas, com um sorriso ao canto dos lábios salgados e fez que sim com a cabeça. Começou a passar pelas quebradas do mar devagar, de top e calcinha, com o cabelo molhado a lhe tocar a cintura bem definida. Ele deixou as roupas na areia e entrou silenciosamente na água. Logo, ela sentiu o corpo atrás do seu, pulsante e firme. Sorriu para o céu escuro, de olhos fechados. Abriu-os novamente por causa da pressão que os dedos dele faziam entre suas pernas, sob o mar agitado. A barba dele lhe arranhava as costas e a nuca, em beijos ofegantes. Virou-a de frente para si e a pegou no colo, com as pernas envoltas em sua cintura. Ele a segurou pelas pernas e a fez subir. E depois descer. A Lua já havia sumido há tempos e o Sol ainda não havia dado as caras. Eram só as ondas silenciosas, eles e seus sussurros. Ela segurou-se nele pelos braços fortes, que apoiavam suas pernas douradas, e deitou na ág

Pernas.

Ela ficou uns segundos olhando a rua, lá embaixo, que ele havia apontado. Tentou imaginar que horas eram, sem sucesso. Se virou em sua direção para dar tchau (dessa vez era de verdade). Ele foi mais rápido. Sentado na cama alta, tinha as pernas compridas apoiadas no chão. Ela no meio. A puxou pela cintura pra mais perto. Sorriram. O Sol ainda batia de leve em seu rosto. Os olhos cor de mel, os cabelos quase loiros. Ali, com as pernas encostadas, se sentiu subitamente protegida. E nem sabia do quê. Com o corpo mais alto que o dele (só naquele momento, claro, tendo em vista que de pé, ele dava umas duas dela), ao abaixar o rosto pra perto do dele, os cachos claros reluziram. Os lábios se encontraram de mansinho. Fecharam os olhos lentamente, a claridade vespertina ficando pra trás das pálpebras devagar. Ele desceu as mãos para as pernas dela. E depois subiu, claro. Natália Albertini.

Vocês se amam? Pra sempre? Jura?

Sou só eu que me sinto plenamente satisfeita quando o relacionamento de um casal termina? Não, gente, não é maldade, eu não sou fria e calculista e, sim, tenho um órgão bombeador de sangue também. É só que acho tudo muito interessante. Não sou adepta do sentimentalismo exagerado. Na verdade, já senti repulsa pelo simples tom sentimental emitido por algumas pessoas. Hoje sou mais tranquila com isso. Mas o exagero e a irrealidade com que esses sentimentos são expostos ainda me incomodam bastante. E, claro, se pronuncio esse tipo de coisa em voz alta, olhadas tortas e proferição de palavras ruins são expelidas com prontidão. Entretanto, não mudo minha perspectiva. Eu não acredito em amor eterno. Isso não quer dizer que eu seja má, que eu não tenha um pingo de esperança na vida ou que nunca vou encontrar um pra mim, que nunca vou mudar de opinião. Mas por enquanto, não acredito. E nada me faz acreditar. E não tenho vergonha de proclamar. Ainda acho uma grande besteira quando alguém me fa

Água quente.

Ando cansada. Ando extremamente cansada, exausta. Sim, tenho ido bem. Sim, respondo a todos com sorrisos extravagantes e exclamações sadias. O que me cansa é estar sempre tão bem. Ser sempre tão segura e sempre me obrigar a engolir qualquer mágoa que tenha. Quem fala aqui é a Natália de dentro, a que é empurrada e esmagada internamente todos os dias, cujas lágrimas são reprimidas por repuxadas de bochechas que foram sorrisos falsos. Aquela que todas as noites abre a mente em forma de sonhos nostálgicos e poeirentos. Aquela dona do próprio coração. Me disseram que depois te um tempo, a dor cessa. Com todo o respeito a aqueles que me disseram isso, eu sei que tiveram a melhor das intenções, mas vocês erraram. Ela não cessa. Aprendi a lidar com ela, claro, mas ela jamais cessa ou sequer diminui. Me distraio com algumas coisas durante certo tempo. E, sabe, tenho ficado muito boa nisso. As pessoas me veem como alguém que está sempre de bem com o mundo, com a vida, sempre segura e sempre

Amy, Heineken e Aristóteles.

Amy cantava The Girl of Ipanema em seu tom ebriamente encantador, as batidas flutuavam para fora das caixas de som do estéreo. Eu estava à pia, com o quadril encostado na pedra fria, de biquíni. Os cabelos me caíam às espáduas enquanto eu degustava aquele finzinho de Heineken. O calor me lambuzava. Deixei a latinha vazia no lixo e saí da cozinha. Passei pela sacada, a rede parada, o sol se esparramando sala a dentro. Voltei ao quarto, me joguei à cama, de volta às leituras virtuais. O Sol me lambia as costas desnudas, lendo comigo as palavras aristotélicas. Ps.: praia. <3 Natália Albertini.