Abre bem a boca.

Apoiava-se num dos bancos para manter o equilíbrio enquanto o veículo grande e metálico fazia manobras, freava e avançava nos sinais. Olhava pelo vidro, enxergando sem ver o mundo andante lá de fora. Foi quando, impulsionada por um movimento do ônibus, sentiu aquele cheiro tão familiar e ao mesmo tempo tão estranho.
Empurrou a cabeça para a direita e então a viu: a mulher estava sentada num dos assentos, com uma expressão facial de profunda agonia, enquanto segurava com a mão esquerda uma pequena toalha cor-de-rosa, encharcada daquele líquido rubro e viscoso tão bem conhecido de todos.
Franziu o cenho e tentou respirar o mínimo possível, evitando que o odor da desconhecida subisse por suas narinas, embora hipnotizada pela cor de tamanha aflição. A mulher levou a toalha à boca e a enxugou, umidecendo ainda mais o algodão com aquela cor escura. Então todo aquele sangue vinha dali, da boca dela que parecia jorrar visco. Ora essa, mulher, o gato comeu-lhe a língua?
Independente do autor ter sido Hannibal ou qualquer outro felino de Chesire, a cena passou-se num intervalo tão curto que não lhe deu tempo de sentir pena.
Assim que desceu do coletivo, levou o pulso ao nariz e puxou o perfume com força, obrigando-o a substituir o cheiro anterior. Se incomodava profundamente de inalar a intimidade dos outros assim, sentia-se invasiva e invadida, bem como detestava que outros sentissem a sua.

Ps.: Be careful, maybe Hannibal is actually in town, 'cause the scene was real. o.o'
Natália Albertini.

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