Cafeína.

Duas batidas delicadas na porta lígnea. Com um lenço de papel na mão direita e o cabelo desajeitado, foi atender a porta.
- Oi, Li - a voz serena e tranquilizadora disse.
O lenço de papel foi largado para que as mãos pudessem encontrar a nuca e as costas do recém-chegado coração.
- Entre - a voz chorosa convidou.
A porta foi fechada de maneira sutil e os dois corpos se permitiram não se moverem.
- Nada ainda?
- Não - e mais lágrimas brotaram-lhe aos pés dos olhos.
Abraçaram-se por algum tempo, e no silêncio estabelecido, conseguiram ouvir murmúrios vindo do escritório.
- Vou lá vê-lo.
- Não! Ele não vai te reconhecer!
- Vai, sim - soltando-se das finas e molhadas mão.
- Não, por favor! Ele não sabe quem eu sou. Só sirvo para fazer-lhe café. Nem comer ele come mais.
Não deu ouvidos e caminhou pelo corredor, abrindo a porta que deveria dar para o escritório. O que na verdade encontrou foi uma aura prateada que mantinha em suspensão palavras rimadas em português, alemão, italiano, inglês e espanhol.
- Papai?
- Get out of here! You hijo de la puta!
Por sorte, conseguiu fechar a porta milésimos de segundos antes da xícara de porcelana atingir-lhe a cabeça. Respirou fundo e voltou a abraçar a irmã que ainda chorava.
- Eu te disse! - vacilou - Oh, meu Deus, já faz mais de uma semana e tudo o que ele faz é elaborar poesias misturando as línguas e pedir mais café - as palavras saíram entrecortadas por soluços.
- Ele pede?
- Na verdade, ele ordena. E ordena para ela.
A partir daí os soluços foram de ambos, e durante alguns pequenos intervalos, o poeta gritava de sua toca:
- More coffee, mujer!

Natália Albertini.

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