Filhos indisciplinados.

A porta do meu quarto é aberta com um estalo sutil, levanto os olhos e vejo minha mãe. Com as mãos atrás do corpo, escondendo algo, ela me diz:
- Olha, só porque você é uma menina muito responsável e adorável, merece um agrado.
Põe as mãos à frente e me mostra um prato com pururuca (sim, causa uma puta indigestão, mas é tão gostoso...). Sorrio para ela, e enquanto pego o prato, ela continua, com um tom de censura:
- Ná, olha aqui pra mim.
Olho.
- É sério...
Espero que conclua.
- Já chega, tá?
Cara de interrogação.
- Já deu de estudar.
- Ah...isso.
- É, já chega, tá?
Reticências. Volto aos estudos.

Uma ou duas horas mais tarde, ela volta a meu quarto, com um tom pesaroso:
- Filha, numa boa...já não chega por hoje?
- Não, mãe, não dá. Tô testando a capacidade de armazenamento da minha massa encefálica. Sabia que tudo que aprendemos é gravado no cérebro e que as funções involuntárias, como respirar, são controladas pelo bulbo, e que...
Ela suspira e, profundamente decepcionada, comovida com sua perda de influência sobre mim, me deixa falando sozinha, enquanto eu já me perdia nos cálculos dos coeficientes angulares.

E pensar que ainda há alguns meses, era exatamente o contrário: dizia-me que já bastava a diversão, e que fosse aos estudos.
Quem sabe um dia eu alcanço o equilíbrio, não?
Equilíbrio...isso me lembra ponto de compensação fótico, que é o ponto em que a respiração e a fotossíntese...

Natália Albertini.

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